O deputado federal Mário Negromonte
Júnior, do Partido Progressista da Bahia, absteve-se de votar a favor ou contra
o impeachment de Dilma Rousseff. Uma gratidão, nada mais do que isto.
Quando o pai Mário Negromonte era
ministro das Cidades, a presidente Dilma o sustentou no cargo por algum tempo
contra a vontade do ex-presidente Lula da Silva.
Naquela quadra do governo, Lula da
Silva pensava ser Deus – ainda hoje ele pensa, mas com menor intensidade, tendo
em vista as sucessivas derrotas morais por que vem passando – e achava-se no
direito de ditar normas. Ainda não se havia recolhido à sua insignificância de
enganador do povo e não tinha caído em desgraça.
Nos bastidores de Brasília não era
nenhuma novidade que o Ministério das Cidades era tocado por Gilberto Carvalho,
à época ministro da Secretaria Geral da Presidência da República e amigo
confidente de Lula, espécie de espião lulista no governo Dilma.
Formalmente Negromonte estava investido
no cargo de ministro, mas na prática nada decidia. Pensava ser ministro e Dilma
Rousseff fingia que ele era ministro, mas politicamente ficou muito fraco,
insustentável. Acabou caindo. Lula da Silva não queria Mário Negromonte. Nunca
quis.
Numa noite de janeiro de 2012 estiveram
na casa de Lula, em São Bernardo do Campo, a presidente Dilma e o então
governador da Bahia, Jaques Wagner, fiador de Negromonte, que suas orelhas
devem ter ardido muito. Naquela noite seu destino estava selado. A queda era
uma questão de tempo, não mais uma decisão de governo.
Todavia, por ocasião da saída, o
governo publicou que Negromonte pediu demissão. Tudo lorota. A carta de
demissão dele foi acertada, dias antes, em Salvador, com então governador
Jaques Wagner e a presidente Dilma. Mais tarde, Wagner e Dilma viajaram juntos
e obrigaram Negromonte a acertar os detalhes da entrega da carta quando ela
retornasse de uma viagem a Cuba e Haiti, o que foi feito, tudo conforme o
figurino.
É assim a praxe em qualquer governo.
Politicamente, fica mais feio ser demitido do que pedir demissão. O que é o
governo senão uma hipocrisia?
Na condição de nordestino e sertanejo
das caatingas baianas de Curaçá e Chorrochó, torci muito para o então ministro
Mário Negromonte dar certo. E torcia por uma razão muito simples: nosso sertão
sempre foi abandonado porque lhe faltava peso político junto aos governos da
República. E aí apareceu no horizonte uma situação um pouco diferente:
Negromonte ministro, a mulher Ena Vilma prefeita de um município do sertão
baiano, o filho Mário Negromonte Júnior na época deputado estadual da Bahia.
Isto podia contar em benefício da
região como um todo, independentemente de política partidária. Mas o homem era
pesado demais para o governo carregar. Acabou ficando pelo caminho.
Entretanto, nem tudo que parece eterno
dura para sempre. Depois veio a glória. O então governador Jaques Wagner
engendrou um plano para colocar Mário Negromonte na função de conselheiro do
Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia. Deu certo. Uma sinecura vitalícia,
um manjar.
Mas sempre há um dia atrás do outro e
uma noite no meio. Surgiram denúncias contra Mário Negromonte no bojo de uma
delação premiada, que o colocou no centro de mais um escândalo de desvio de
dinheiro público da Petrobras. Pior: mais tarde, o filho e deputado federal
Mario Júnior também passou a frequentar as páginas policiais, igualmente
suspeito de beneficiar-se de dinheiro ilícito.
É prematuro colocar em ambos a pecha de
desonestos. Tudo depende de investigação e provas, que ainda são muito frágeis.
Nem tudo que parece é. Mas a situação é cavernosa. O pai Mário Negromonte deve
seu cargo de conselheiro do Tribunal de Contas a Jaques Wagner e deve à
presidente Dilma a nomeação para o Ministério das Cidades. Jaques Wagner
hoje é um dos principais ministros de Dilma Rousseff. Ele garantiu, na ponta do
lápis, os votos dos deputados federais baianos contra o impeachment. Vigiados
pelo implacável olhar do eleitor, alguns votaram conscientemente, outros
subservientemente. Mas votaram.
O deputado Mário Júnior absteve-se.
Enalteceu Paulo Afonso e Glória, mas fez um papel que a grandeza política não
ampara. E esqueceu a memória dos saudosos mestres Dr. Adauto Pereira de Souza e
Dionísio Pereira.
Ficou em cima do muro da esperteza, com
um pé na já fragilizada confiança do eleitor e outro no dever de gratidão à
presidente Dilma e Jaques Wagner. Pode ser cobrado futuramente nas urnas, mas o
sentimento de gratidão é nobre diante da fraqueza humana. Podia ter votado a
favor, podia ter votado contra o impeachment. Não há demérito nenhum em
obedecer à própria consciência.
Convenhamos, para um político jovem,
que a Bahia lhe outorgou um mandato parlamentar e esperança, a abstenção não
foi uma decisão sábia.
Blog de Walter Araujo.
ELOY NETTO
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