A fraude eleitoral
existe no Brasil desde a proclamação da República. Com a extinção da Monarquia,
surgiu o controle do voto pelos “coronéis”, assim entendidos os fazendeiros,
latifundiários e chefes políticos, que gozavam de grande prestígio em seus
municípios.
O título “coronel”,
portanto, vem dos grandes proprietários de terra, que herdavam do Império a
condição de comandantes da Guarda Nacional, mesmo que nada comandassem. Durante
mais de um século, havia um regimento dela, embora precário, em cada um dos
municípios brasileiros. E a palavra “coronel” passou a ser sinônimo de poder,
liderança e respeito.
Nessa época surgiu o
chamado “bico de pena”, controle pelo qual os chefes políticos locais
adulteravam as atas das mesas eleitorais, que apuravam os votos, ajustando-as
às suas vontades e proclamando eleitos os seus protegidos.
Outro aliado do poder
dos “coronéis” era o “voto de cabresto”. Significava que o eleitor obedecia
inquestionavelmente às ordens dos chefes políticos, votando nos candidatos que
eles indicavam. Convenhamos, não mudou muito.
Estranhamente, os
mortos também “votavam”, em muitas situações. Os chefes políticos preenchiam e
inseriam nas urnas cédulas em nome de pessoas falecidas, para garantirem a
vitória de seus pupilos sobre os adversários. Há um ditado no meu sempre
querido Nordeste, segundo o qual, “o cemitério é a mais antiga seção
eleitoral”. Como se vê, os “coronéis” eram criativos, como são hoje seus
similares.
Com a evolução do
sistema eleitoral, essas práticas diminuíram, mas persistiram outras,
igualmente abomináveis. Estão aí, permeando campanhas eleitoras, a exemplo da
distribuição de afagos materiais e recompensa financeira que políticos
inescrupulosos oferecem a eleitores pouco conscientes, em troca de votos. A ilegalidade
da prática parece não intimidá-los.
Abaré é um município
baiano relativamente novo. A sede debruça-se à margem direita do Rio São
Francisco sob as bênçãos de Santo Antonio, seu padroeiro. Emancipou-se em 1962,
salvo engano e progrediu até acima da média, relativamente aos seus vizinhos,
mas vive às voltas com práticas políticas ultrapassadas, segundo se depreende
do noticiário. O município mantém vícios e contradições incompatíveis com seu
crescimento, o que depõe contra algumas lideranças políticas locais.
A apreciação de uma
representação eleitoral pela Justiça, no segundo semestre de 2015, resultou no
afastamento do prefeito e sua vice-prefeita, acusados de distribuição de cestas
básicas na zona rural do município, durante a campanha eleitoral de 2012, com o
suposto intuito de angariar votos. Por força de medida liminar, como é praxe,
ambos reassumiram seus cargos, mas o processo seguiu os trâmites normais,
segundo as normas processuais.
Agora, também segundo
o noticiário, o Tribunal Regional Eleitoral da Bahia cassou os diplomas de Suas
Excelências, embora, em tese, a decisão ainda possa ser atacada em sede de
recurso.
Segmentos da
população de Abaré aduzem que esse quiproquó das cestas básicas teve a
participação moral do Dr. Delísio Oliveira da Silva, ex-prefeito do município e
uma espécie de “coronel” local. Dr. Delísio mantém inegável ascendência
política sobre o prefeito cassado. Trata-se de um líder político com acentuada
respeitabilidade e mestre em fazer engendragens no contexto político-administrativo
de Abaré. Não gosta de ser chamado de “coronel”, mas a alcunha até que lhe caiu
bem.
Dr. Delísio Oliveira
é frio como asa de avião, astuto e estrategista. Certamente vai longe em sua
tumultuada carreira política. Com ou sem entraves judiciais, com ou sem
distribuição de cestas básicas. Mas esta situação atual acaba por vergar a
moral dos líderes envolvidos.
araujo-costa@uol.com.br
TEXTO DE WALTER ARAÚJO COSTA
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